Por: | 14/02/2025
Academia: erros e morte
Hildeberto Barbosa Filho
Fosse prefeito ou governador, faria tudo pela APL - Academia Paraibana de Letras. Só teria uma exigência: só deveria entrar ali quem, de fato, fez alguma coisa de substancial pela vida cultural da Paraíba. Emprego o verbo fazer no passado. Academia é lugar do passado. E passado que é passado não passa.
Se o
prefeito ou o governador não sabem isto, sua assessoria deveria saber. A Academia Paraibana de Letras é um patrimônio de todos nós. Assim como o jornal A União, o Correio das Artes, o Teatro Santa Rosa, a Bica, a Lagoa etc. Ela é e deve ser a instituição mais importante do estado, considerada a função maior da literatura e do saber.
Tudo me parece muito simples. É só questão de bom senso. Aposto numa comissão permanente de acadêmicos qualificados com um único objetivo: acompanhar os passos da cena artística, científica e literária, como fazem os olheiros do futebol, para sugerir nomes que a sociedade reconhece, respeita e louva, indicando, por conseguinte, este ou aquele, esta ou aquela, conforme a ocasião. Isto é, quando eu ou os meus confrades e as minhas confreiras se forem desta para uma melhor. Sei que muitos o desejam, o mais rápido possível, pois o bicho humano não presta, e a vaidade doentia desconhece o sentido da norma moral.
Não sei por que quem governa não pensa nisto. Não sei por que quem governa nunca pensa…
Tratar do tema da Academia é tratar do tema da morte. A morte me parece a grande lição. Uma cifra perfeita do absoluto. Ela nos diz, assim, de repente, como uma batida inesperada, que não somos nada, nem melhor nem maior ou menor que ninguém.
Não são os vivos que fazem a vida da Academia. A vida da Academia é feita principalmente pelos mortos. Nada é tão verdadeiro e eterno como os mortos. A lógica me parece exatamente esta. É a morte o alicerce invisível da Academia. A morte, o passado, o que foi e o que poderia ter sido. E isto me parece essencial. O essencial é principalmente o que não se vê.
São eles, os retratos, que respiram a vida. Cabe a nós, os vivos, merecermos a grandeza e a beleza desta respiração. O brilho lapidar da morte.
Falo isto, porque um Zé Lins, um Augusto dos Anjos, um Zé Américo, um Álvaro de Carvalho, um Alcides Bezerra, um Otávio Sitônio Pinto, um Luiz Augusto Crispim, um Osias Gomes, um Ascendino Leite, um Jackson de Carvalho, um Ariano Suassuna e tantos outros deveriam se jactar daqueles que os sucederam.
Tirante as exceções, sinto que isto não tem acontecido. O que quero nunca acontece. E sempre quase nada acontece. A vida, por exemplo, não seria um acontecimento que nunca aconteceu? Mas, afinal, o que é um acontecimento?
A Academia tem errado muito. E, parece, tende a errar muito mais. Também pudera! Ela não tem se dado ao devido respeito. Veste-se mal, põe o batom mais inadequado, perfume de terceira, lingerie de quinta, nos momentos mais sagrados.
Explico. Como se escolhe fulano e não beltrano? Como não se vota no leão e se elege a raposa? Chamo isto de vergonha, de baixaria, covardia, obscenidade.
Claro: se não tomarmos uma atitude, necessária e corajosa, diante dos erros que se acumulam e se repetem, a pornografia vai continuar. Ou seja, a Casa, a vetusta Casa de Coriolano de Medeiros, será banalizada e se transformará numa dessas academias de beira de mar ou de qualquer esquina de bairro. Centros grotescos onde frutifica o narcisismo patogênico em torno de uma suposta e ridícula imortalidade.
Temo por estas vagas que surgem. Não quero que falte verdade, valor, competência, criatividade, erotismo, sabedoria, sobretudo, sabedoria e erotismo, nos que se acham no direito de ocupá-las.
Cada vez morremos mais. E vamos morrer mais. E muito mais. A imortalidade é apenas uma doce ilusão. O futuro não perdoa. Vamos, então, ter dignidade. Se não tivermos sapiência e autonomia para mudar os Estatutos da Casa, pelo menos procuremos cumpri-lo naquilo que ele tem de melhor: o poder do indeferimento que nos concedem. Dito de outra forma: indeferir é preciso, quando certos candidatos ou candidatas assinam o requerimento, pleiteando uma vaga. Doa em quem doer!