Hildeberto Barbosa
Hildeberto Barbosa
Hildeberto Barbosa

Academia: Votarei contra!

Por: | 01/03/2025

Academia: Votarei contra!
Hildeberto Barbosa Filho

Com este texto, encerro uma trilogia que tem, como objeto de reflexão, a APL: Academia Paraibana de Letras. Antecederam-no “Academia, meu mal, meu bem” e “Academia: erros e morte”. Agora publico o terceiro e último. Último desta safra e desta circunstância

Muitos não gostaram dos dois anteriores, eu sei. Alguns se consideraram atingidos pelas minhas palavras. Outros me deram razão, mas não concordaram com certas expressões do meu estilo. Ora, o estilo é o homem, leciona Buffon. E meu estilo é assim mesmo. Verdadeiro e desesperado como eu.

No frigir dos ovos, muita bobagem! Não citei ninguém, não nomeei ninguém, não pensei em ninguém, especificamente, quando os escrevi. Pensei no grupo, no coletivo, na instituição, almejando melhorar a sua imagem perante o corpo social. Coisa quixotesca. Atitude, talvez, de um solitário idealista.

Quando entrei na Casa (não liguem para a regência do verbo. Sei o que estou fazendo. Amo a flor do Lácio, como muitos não amam e desconhecem!). Era 1999, mês de setembro. E setembro, se não é o pior dos meses, tem os ásperos vinhos do vento soprando nas raízes do meu coração, assim como as águas de outubro e a eternidade de fevereiro, que selaram o meu destino.

Nossa Casa é a Casa da palavra. A Casa da memória, a Casa do pensamento. A Casa do saber. Podres poderes à parte!

Vejam bem: Augusto dos Anjos está lá, na efígie incorruptível de um verso superior. O poeta do Tamarindo justifica a existência da Casa. A Casa deve merecer a memória dilacerada do poeta, o percurso encantatório de seus versos pelo lodo triste e esquecido do rio Paraíba.

Como é, então, meus infortunados confrades, minhas dignas confreiras, que temos de suportar a nefasta candidatura de tantas nulidades? Devemos nos dar ao respeito ou, então, capitular diante da mediocridade, aplaudir e louvar, de vez, a hipocrisia?

Sofro a dor da solidão de um imortal que não tem aonde cair morto. Mas, se vida me resta, viverei para protestar contra essa enorme fraude que nos cerca. A Academia não pode virar um Rotary Club de burgueses enfastiados, um centro esotérico, uma seita evangélica, um SPA de ginástica, repouso ou contemplação.

Estou na lista da morte. Todo acadêmico está. Eis o preço que se paga por uma estranha e incompreensível imortalidade. Todos estamos à mercê da indesejada das gentes. É ela o texto final. A chave de ouro deste soneto que ninguém ousa concluir. Que nos diz e nos revela. Ninguém sabe o ditame deste torpor. O quanto dói sabermos que não somos nada. O sofrimento devido a certas coisas, ou melhor, a certas eleições, ainda dói e perdura como o compasso metafísico de alguns versos de Jorge Luís Borges.

Fulano, só por ser vaidoso, transitar nos becos do poder, assinar colunas em jornais, bajular e bajular, nunca ter lido nada, a não ser Dale Carnegie e Paulo Coelho, se acha legítimo candidato. Sicrano, por sua vez, nem sabendo virgular, nem imagina que certos sinais de pontuação podem decidir o destino do mundo, acredita, piamente, no seus dotes de futuro acadêmico, transitando, soberbo, entre seus pares, como um meloso Anatole France da Província.

E mais, muito mais!

Alguns deles usam o nome da família e a garantia de seus feudos e sesmarias como credenciais para a candidatura. Outros traficam as relações sociais, falam o idioma sutil do crime organizado (“toma lá dá cá”) e se acham dignos da Casa de Coriolano de Medeiros. Há, também, os que ignoram, de fato, a real consistência da vida cultural que os cerca. Não leem nada nem ninguém. Não sabem distinguir um Manuel Bandeira de um J.G. de Araújo Jorge.

Desculpem, ilustres leitores, insignes confrades, respeitáveis confreiras, sinto-me como mais um Sísifo a rolar a inutilidade de uma pedra sem sentido. Constato, a essas alturas, entre perplexo e decepcionado, que minhas palavras têm sido em vão. Nietzsche dizia que não se deve jogar pérolas aos porcos. Astier Basílio, em verso único e fulminante, diz que a felicidade é para os medíocres.

Pois bem: se tivesse como, rasgava os Estatutos medíocres e bestas que nos regem. Criaria outras normas como um doce tirano que ama a sua Casa. E diria: aqui só entra quem sabe ler, escrever, pensar… Quem fez alguma coisa pela terra e quem, de fato, contribuiu para o nosso acervo cultural. Gente que nos orgulha, que nos envaidece, que admiramos, que amamos.

Quem? Quem? Quem?

A Casa também existe para reconhecer e premiar. Para reverenciar e distinguir. Por que ela mesma não escolhe e indica o seu candidato? Nisto sou conservador. E poderia contribuir muito, sem falsa modéstia, para as indicações de futuros nomes.

Eu não seria nunca um Machado de Assis, purista rigoroso, atento apenas aos escritores literários, quando da fundação da ABL, Academia Brasileira de Letras. Ele, Lúcio de Mendonça e Medeiros e Albuquerque. Sou mais um Joaquim Nabuco. Cabeça mais arejada, pelo menos neste curioso setor das idiossincrasias acadêmicas, aberta ao crivo de outras mentalidades, consciente de suas intrínsecas contradições.

A Casa, a nossa Casa é grande e flexível. Tradicional e moderna. Nela cabe até juiz, promotor, médico, padre, engenheiro, químico, figuras públicas, notáveis, sobretudo, se defendem a causa cultural e artística. Amar a cultura é uma maneira singular de ser culto. Claro, defendo a tese como uma rigorosa exceção. Porque a Casa, no fundo, na essência, deve ser dos escritores literários. Dos poetas, ficcionistas, ensaístas etc.

Quem não gostar do que digo, me mande pra aquele lugar. Se for candidato ou candidata, não me peça voto. Votarei contra!


FONTE: Facebook - Acesse

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