O poeta em nada difere do homem comum. O poema nada mais é que a linguagem se exercitando por dentro de seus músculos vocabulares. O poeta dorme, o poeta come, o poeta se embriaga. Vai à feira, toma remédios, caminha pela manhã com seu cachorro de pelúcia e sua chave de ouro. O poema se sustenta nas vértebras das mesmas palavras da prosa. Nada de extraordinário cabe dentro de sua arquitetura iluminada. Poeta e poema não são coisas de outro mundo. Existe mesmo um outro mundo? Não sei. Se existe, e existem tantas coisas que não existem, não é na clareira do poema que essa realidade se converte em poesia. A poesia, pelo menos para mim que ainda não se considera poeta, escorre das ofertas mais bestas que o cotidiano consagra. Um copo de vidro, uma esquina espiando para a lua, um olhar de medusa decifrando o ritmo da morte, a vontade ininterrupta de me atirar no abismo de sua alegria, tudo pode resultar no idioma de um poema. E o que é o poema, senão a festa das palavras. O que é o poeta, senão a criatura que mata e morre para fazer da palavra uma explosão de vida.