Archidy Picado Filho
Archidy Picado Filho
Archidy Picado Filho

ENSINANDO A ESCREVER

Por: | 15/09/2024

Alimentar a Musa, então, tema sobre o qual investimos grande parte do nosso tempo aqui, a mim me parece a contínua corrida atrás de amores, o confronto desses amores com as nossas necessidades presentes e futuras, o movimento das texturas mais simples para as mais complexas, das ingênuas para as mais informadas, das não intelectuais para as intelectuais. Nada nunca é perdido. Se você andou por vastos territórios e ousou amar coisas bobas, aprendeu com os itens mais primitivos coletados e postos de lado em sua vida. De uma curiosidade sempre perambulante por todas as artes, do rádio ruim ao bom teatro, da rima das canções de ninar à sinfonia, do brinquedo selvagem ao Castelo de Kakfa, há uma excelência básica a ser descoberta, verdades a ser encontradas, mantidas, saboreadas e usadas em algum dia posterior.

Ser uma criança do seu tempo é fazer todas essas coisas.

Não dê as costas, por causa do dinheiro, a todas as coisas que você colecionou na vida. Não dê as costas por causa da vaidade de publicar coisas intelectualizadas, ao que você é: o seu material é que faz você individual e, portanto, indispensável para os outros. Para alimentar a Musa, então, você precisa ter sido faminto pela vida desde criança. Se não, é um pouco tarde para começar. Antes tarde do que nunca, claro. Você é capaz disso?

Isso significa que você ainda deve fazer longas caminhadas à noite pela sua cidade ou vilarejo. Ou caminhadas pelo campo durante o dia. E longos passeios, a qualquer hora, por livrarias e bibliotecas.

E, enquanto se alimenta, como manter a sua Musa é o seu problema final.

A Musa deve ter uma forma. Você vai escrever cem palavras por dia durante dez ou vinte anos para tentar dar-lhe uma forma, aprender o suficiente sobre gramática e construção de histórias, assim isso se torna parte do seu subconsciente e não mais restringe ou distorce a Musa.

Ao viver bem, ao observar ao viver, ao ler bem e observar enquanto escreve, você alimenta seu self mais original. Ao treinar a escrita, por meio de exercícios de repetição, imitação, bons exemplos, você constrói um lugar limpo, bem iluminado para manter a Musa. Você dá a ela, a ele, à coisa, ou seja lá ao que for espaço para surgir. E, por meio da prática, você consegue ficar relaxado o suficiente para não encará-la grosseiramente quando a inspiração entrar na sala.

 


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