Waldemar José Solha
Waldemar José Solha
Waldemar José Solha

Igreja do Rosário, em Pombal

Por: | 23/09/2024

Igreja do Rosário, em Pombal. Morei um bom tempo numa república de funcionários solteiros do Banco do Brasil exatamente atrás dela, num casarão antigo que não existe mais. Nesse adro filmamos o assassinato do juiz interpretado pelo Balduíno Léllis, nO Salário da Morte. Para esse adro saí no velório do Dr. Atêncio, em 92, quando o pipoqueiro, estacionado junto à calçada, disse a frase antológica, referindo-se ao ator esguio - de costeletas e bigode - do filme, em 69, e do gordo encanecido e pesado que ali estava:
- O Solha saiu daqui Pedro I, voltou Pedro II.
Eu mostrava o interior da igreja a um visitante de João Pessoa, quando o vi roubando uma das imagens do altar.
- Essa não, cara. Ponha isso no lugar!
- Quem diabo, dá valor pra isso aqui?
- EU dou valor! E você vai botar o santo no lugar de onde o surrupiou!
Nessa igreja há uma ceia de autor desconhecido - século XVIII - que me remete diretamente ao entorno do Aleijadinho, até pelo detalhe do candelabro acima do Cristo.
Na entrada, à esquerda, um quadro do Batismo, que vi o Balduíno, que tem o velório de seu personagem ali - como, muito depois, o Dr. Atêncio - recuperar , enquanto preparavam o seu cenário. Balduíno era diretor do Museu Igreja de São Francisco, aqui em João Pessoa.
Duas interferências externas, quando eu trabalhava no BB, a quinhentos metros dali: o perfume da torrefação de seu Rocha, e as batidas dos sininhos da igreja do Rosário, dando conta de mais um enterro que dali saía.
O casarão atrás, nossa república, tinha sido - diziam-nos - um cemitério. No último quarto, duas redes: a minha e a do colega Gussão - outro paulista: dali víamos, na sala ao lado, a mesa coberta de azulejos em que - antes de nós - eram atendidas as emergências, quando aquilo fora um pronto-socorro. Dr. Azuil dizia: "Vôte, eu mesmo não dormiria aí por nada no mundo: quanto queimado e enforcado atendi naquela mesa!" Vai daí que uma noite chego da rua e vejo Gussão acordado. "Que foi que houve, colega?" E ele:
- Tá vendo aquela mancha no teto? Eu estava na rede quando senti um vento estranho, olhei pra sala e vi um vulto se aproximando. Quando chegou perto, subiu e sumiu ali.
Incapaz de pegar no sono, peguei uma revista e a estava lendo quando vi a mesma coisa. Afundei-me na rede e tentei pedir socorro ao Gussão, que me sacudiu: "Solha! Solha!"
- Eu também vi.
- Você teve um pesadelo.
- Não, eu vi que você também viu o fantasma.
- Não houve nada. Foi um sonho, seu!
Transferi isso para meu primeiro romance, Israel Rêmora, quando já fora transferido para João Pessoa. A mulher de Israel - a Maga que desaparece do Jogo de Amarelinha, do Cortázar, vê o vulto do filho morto lhe aparecer, vindo da sala.
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