Não, o estilo não é o homem como afirma Buffon. O homem é os homens, as coisas, os fatos, as lembranças, as viagens, os sonhos, as perdas, a vida inteira que é e a vida inteira que poderia ter sido, como diz Bandeira. A morte. As paixões. O homem é as suas leituras, seus amores, seus símbolos, sua mitografia pessoal, seu desconforto, sua fala incompleta, seu idioleto. Por isto mesmo desconfio de que não tenho um jeito próprio de escrever. Uma voz só
minha, original e autônoma, tomada pelo mistério e pela saliência de uma expressão inconfundível. Não devo dizer, portanto, “este é o meu estilo, esta é a minha escrita”. Escrevo, sim, o que vi, o que vivi, o que desejo, o que recordo, o que imagino, o que esqueço. Minha matéria, por isto mesmo, me parece precária e fluida, impossível de ser arrumada pelas regras do jogo ambivalente da palavra literária. Escrevo o que li e leio. Outras vozes me possuem, me modelam, me deformam. Não sei o que é um estilo. Sinto-me mesclado por toques e sinais de uma estranha tessitura significante que me domina e me ultrapassa. Sou apenas um eco das vozes alheias que me perseguem e que eu amo.