Paulo Vinícius
Sociólogo e Bancário. Membro da direção Nacional da CTB.
“Tudo muda o tempo todo no mundo. Não adianta mentir, nem fingir pra si mesmo. Agora há tanta vida lá fora e aqui dentro, como uma onda no mar.” – Lulu Santos
Publicado 11/11/2024 10:54
Sem teoria revolucionária não pode haver também movimento revolucionário. Nunca se insistirá demasiadamente nesta ideia numa altura em que a prédica em voga do oportunismo aparece acompanhada de uma atracção pelas formas mais estreitas da atividade prática. (1) – Vladimir Lênin
Ampliar, radicalizando e radicalizar, ampliando. (2) – Diógenes Arruda
Novembro é o mês do mais importante acontecimento da História para a Classe Trabalhadora e, negativamente, para a Burguesia: o dia em que a classe trabalhadora tomou o poder na Rússia dos tzares, 7 de novembro de 1917 e que era ainda contada no calendário juliano no país, 25 de outubro (representativo do atraso da reserva do reacionarismo na Europa e no mundo, a Rússia).
Muitas vezes ao longo da História, o povo foi capaz de se alçar ao poder, mas na Rússia, ao contrário da Comuna de Paris, o poder foi mantido, o povo não foi derrotado. E em menos de 30 anos, construiriam um desenvolvimento industrial tão impetuoso que mudou até as leis do capitalismo, com o advento do surgimento do New Deal nos EUA e do Estado de Bem-estar Social na Europa Ocidental. Tais concessões só houve graças à existência da URSS e a sua superioridade evidente sobre o capitalismo: a capacidade de resolver os problemas, de projetar o futuro. salvariam a Humanidade do Nazi-fascismo, batendo a Alemanha, deixando Hitler na sua ratoeira até seu final covarde e vil. O imensurável sacrifício dos povos da URSS para libertar a humanidade do nazi-fascismo não pode ser esquecido, suas lições não foram em vão.
Talvez, uma dessas lições seja que a Linha Política é imprescindível à vitória. Quando a linha política é correta, até os oportunistas acertam. Quando a linha política tá errada, não tem Che Guevara que se salve.
A Revolução Russa foi fruto da linha política perseguida ao longo de anos, e que teve movimentos decisivos sob a condução de Lênin. Na chegada de Lênin à Rússia, na Estação Finlândia, Petrogrado, o líder bolchevique desceu do trem “dando uma voadora” na aliança possível dos bolcheviques com a social-democracia e o governo Kerenski, porque a dita aliança manteria a Guerra de pé. Havia uma linha que separava o oportunismo em que caíra a II Internacional, e que Lênin denunciara. E, ademais, ele ousou construir a unidade necessária para a construção do poder soviético, e foi ouvido. Ele foi capaz de compreender a necessidade de ajustes e mudanças na linha política para atingir o objetivo que se realizou efetivamente com a tomada do poder pela classe trabalhadora russa. À época, o “natural” seria uma aliança com Kerenski. Lênin desembarcou defendendo a guinada que levou à vitória, contando para isso com o inestimável apoio de Stalin.
Não existe isso de se fazer o que quer e chegar ao sublime objetivo de superar o capitalismo. Lênin há muito alertou o movimento da classe trabalhadora que “Sem consciência revolucionária não há movimento revolucionário”. Essa consigna evidencia o papel da consciência para a ação vitoriosa no campo da luta da classe trabalhadora em seu caminho ao poder, em aliança com os camponeses. Lênin achou a chave de como fazer a classe trabalhadora se unir até o ponto de chegar ao poder, mantê-lo, e dirigir a sociedade. Esse é 1/3 do jogo.
Maquiavel afirmou no início do século XVI em sua obra, o Príncipe:
Não ignoro que muitos foram e são de opinião de que as coisas desse mundo são governadas pela fortuna e por Deus, e que os homens prudentes não se lhes podem opor, e até não têm remédio algum contra elas. Por isso, poder-se-ia julgar que não devemos incomodar-nos demais com as coisas, mas deixar-nos governar pela sorte. Esta opinião tem-se reforçado em nossos dias devido às grandes variações que foram e são vistas todos os dias, além de qualquer conjetura humana. Pensando nisto, às vezes me sinto um tanto inclinado a esta opinião: entretanto, já que o nosso livre-arbítrio não desapareceu, julgo possível ser verdade que a fortuna seja árbitro de metade de nossas ações, mas que também deixe ao nosso governo a outra metade, ou quase. (4) – Maquiavel
A outra metade, ou quase a metade, dependeria da virtú, feita de mérito, de força, de condição, de correlação de forças suficiente. Essa virtú foi plasmada por Lênin no sistema de aliança que reúne a direção do movimento e as amplas massas do povo. Descobriu o jeito de unir a turma, ir para cima e vencer a parada.
Essa chave que Lênin deu à classe trabalhadora corresponde à mesma pergunta que inspirava o célebre italiano, como reunir as forças e virtudes necessárias para chegar ao poder e unir a nação italiana. Além dessa força e dessa legitimidade, é preciso ainda o concurso da fortuna, condições gerais e o acaso, que não dependem da nossa vontade objetiva.
A essas duas variáveis, somo uma terceira parte, e evoco Garrincha, Anjo de Pernas Tortas, que:
“teve atuação decisiva na conquista das Copas de 58 e 62. A ele se credita a hoje famosa expressão “combinar com os russos”. No mundial de 58, antes do jogo contra a extinta União Soviética, em que o Brasil venceu o time adversário por 2 X 0, teria ocorrido um diálogo sui generis entre Garrincha e o técnico Vicente Feola. Conta-se que Vicente disse ao atleta para pegar a bola, driblar o primeiro beque, driblar o segundo, ir até a linha de fundo e cruzar forte para trás para Vavá marcar. Garrincha, então, respondeu: “Tudo bem, mas o senhor já combinou com os russos?”. (5) – Garrincha
Ou seja, Virtú, Fortuna e o outro que joga o jogo, o adversário. Essa tríade é suficiente para dar nó na cabeça, dar nó em pingo d`água. Mas pelo menos coloca a luta como o motor da transformação e o caminho para vencer as grandes batalhas.
Lênin achou o caminho, o regime tzarista não reuniu forças suficientes para se manter, os acontecimentos mundiais colocaram a urgência da Paz, do Pão e da Terra, e a classe trabalhadora e os camponeses russos chegaram ao poder no maior país da Terra.
Essa resposta ao dilema da chegada ao poder e da união necessária brilhou como um farol diante dos trabalhadores de todo o mundo – inclusive o movimento anarquista brasileiro, colocado diante do impasse face à greve geral não ter sido capaz de acabar com o capital. As vitoriosas greves multitudinárias que desembocaram na Greve Geral de 1917 não eram suficientes para assegurar os acordos, ou mesmo a democracia e o movimento sindical. Para isso era necessário uma organização política e a luta pelo poder. Foi essa a via que a Revolução Socialista Russa de 1917 apontou, o caminho das pedras, a linha política justa e inovadora de Lênin. A partir de Lênin e da Revolução Socialista de 1917 na Rússia, a classe trabalhadora passa a jogar o jogo principal, disputando contra a burguesia imperialista os caminhos do mundo.
Quando a linha política é justa, os caminhos se abrem, as coisas acontecem, e o jogo muda, inclusive ficando mais difícil. Mas devemos estar atentos a reconhecer os erros ainda mais que as vitórias, e o pior erro é achar que as coisas são paradas, que elas não mudam. Ruim não é ajustar a política, mas sim ser derrotado. Ser derrotado e não tirar lições só pode levar a novas derrotas.
Precisamos de uma linha política justa. Se ela estiver pensa, torta, perde-se o rumo. Diógenes Arruda Câmara Ferreira, refletindo sobre Lênin, brindou-nos com uma consigna dialética: “Ampliar, radicalizando e radicalizar, ampliando”, voltada a analisar esse movimento de estica e puxa da vida, da luta, que não podemos apenas cuidar do peixe, tem também de cuidar do gato. Fica essa dica, de que há que ampliar, mas há que também fortalecer o campo popular para o enfrentamento das batalhas cada vez mais duras de nossa época. Cadê o povo? Cadê a juventude?
A linha política justa funciona, ecoa no coração do povo. Mesmo quando a situação é muito difícil, ela ajuda a sobreviver. Mas a realidade é rápida e desafiadora, camarão parado a onda leva. Os chineses têm um dito que me vem à mente, diante de tantas tendências à dispersão do nosso povo, com o Brasil em perigo: “entregues a si mesmas as coisas tendem para o caos” (sic). Tem que ter consciência, unidade e tem de ter povo, só uma ação coordenada que unifique milhões poderá se aproximar do objetivo.
É preciso trazer o povo para a batalha, pois a extrema direita e o fascismo estão a disputá-lo. Esses milhões foram o Bônus Demográfico de 2012, a Turma da Xuxa (ou seja, o povo que viu a Xuxa), e nossos filhos. É a geração dos anos 2000. E nessa turma estão a maioria da classe trabalhadora de mulheres, negros e pardos, precarizados, plataformizados, uberizados, soltos no mundo VUCA e esperando o apocalipse zumbi. Nossa aliança tem de ser ampla, mas também precisa ter a profundidade do resgate da classe trabalhadora brasileira pela sua valorização, na luta da Nação contra os juros e o rentismo parasitário.
Temos campo para isso. Basta combinar com os Chineses, com os Russos, com a Venezuela, inclusive. Ai de nós, se não tivéssemos visto a necessidade da Frente Ampla. Se nos angustiam as falhas, talvez isso decorra de ainda faltar a Unidade Popular para organizar o próximo passo, quando não pudermos mais ser salvos pelo Lula. Ele já começou a entender isso, quando disse que Lula é o povo. É preciso chamar o povo para ser como o Lula, e resgatar a política. Getúlio ficou só. Lula não está sozinho, mas é preciso organizar essa maioria. É preciso juntar as pessoas, lutar pela Hegemonia, salvar o Brasil e, assim, abrir caminhos ao Socialismo. É uma tarefa de milhões que só pode ser vencida pela Unidade Popular.
REFERÊNCIAS:
(1) LENIN, Vladimir. Que Fazer? Dogmatismo e «Liberdade de Crítica» Marxist Internet Archive.
(2) BUONICORE, Augusto. O Partido Comunista do Brasil em 1968. Fuindação Maurício Grabois https://grabois.org.br/2018/11/23/o-partido-comunista-do-brasil-em-1968/
(3) Imagens da centenária história de lutas do Partido Comunista do Brasil (1922-2022) [recurso eletrônico] / organizado por Adalberto Monteiro e Fernando Garcia de Faria. – São Paulo, SP: Anita Garibaldi ; Fundação Maurício Grabois, 2021. 584 p.; PDF; 406 MB. ISBN: 978-65-89805-10-6 (Ebook)
(4) MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe, p. 119. Martins Fontes, 2001. São Paulo.
(5) Fundação Cultural Palmares. Garrincha: a vida escreve certo por pernas tortas https://www.gov.br/palmares/pt-br/assuntos/noticias/garrincha-a-vida-escreve-certo-por-pernas-tortas
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