Lula, o Itamaraty e o Itamaraty paralelo, na figura de Celso Amorim, estão frustrados e irritados com Nicolás Maduro. Não porque ele está se agarrando ao poder, derramando sangue de venezuelanos inocentes e praticando terrorismo de Estado, mas porque está fazendo isso de modo explícito, sem nenhum disfarce.
Lula se ressente com o velho companheiro por não ter guardado a lição preciosa, prodigalizada por ele, naquele inolvidável reencontro, em 2023, quando, recebendo Maduro com todas as pompas no Brasil, disse-lhe em alto e bom som:
“Se eu quiser vencer uma batalha, eu preciso construir uma narrativa para destruir o meu potencial inimigo. Você sabe a narrativa que se construiu contra a Venezuela, de antidemocracia e do autoritarismo. […] É preciso que você construa a sua narrativa e eu acho que, por tudo que conversamos, a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que a que eles têm contado contra você. […] Está nas suas mãos, companheiro, construir a sua narrativa.”
Eis a estratégia solidariamente traçada para o ditador amigo. Bastava segui-la. Mas, para desassossego de Lula, Maduro não tem a sua inteligência para o mal. Ele pratica o mal sem inteligência mesmo.
A diferença entre Lula e Maduro é o ardil. Lula é uma raposa velha, um demagogo, um sofista, um sedutor, um carismático príncipe de Maquiavel capaz de se passar por democrata, humanista, pacifista e cristão quando se faz necessário. Maduro é um aloprado, ignorante, obtuso, incapaz de criar uma “narrativa” que disfarce de democracia o seu exercício tirânico do poder.
O incômodo de Lula e Amorim, como ficou óbvio, não foi com a fraude das eleições na Venezuela, mas com a incapacidade de Maduro e seus asseclas produzirem uma fraude bem-feita. Lula está agora paralisado pela incapacidade de tomar qualquer decisão decente, e seu acovardamento vai lentamente afundando a outrora internacionalmente celebrada diplomacia brasileira no charco da irrelevância.
Ele segue embaraçado com as extravagâncias, violências e crimes de Maduro e tenta escapar ao continuado desgaste através do cinismo; mas não tem conseguido sequer livrar a si e ao seu governo de vexames e do ridículo; ridículo este agravado pela audaciosa iniciativa de propor uma segunda eleição na Venezuela.
Muito se vem escarnecendo dessa proposta indecente e descarada, mas não vi nada de melhor do que o deboche feito pelo “El Chigüire Bipolar”, jornal de humor que circula em Caracas, que colocou em primeira página um retrato de Celso Amorim e cravou a seguinte manchete: “Brasil propone repetir elecciones hasta que gane Maduro”.
Pois bem, não apenas a oposição venezuelana vitoriosa e mais vinte e seis ex-chefes de Estado rechaçaram a ideia bizarra, mas o próprio Maduro fez pouco-caso.
Ao rejeitar a ideia de uma nova eleição e desprezar a oportunidade de tentar fraudá-la mais uma vez, Maduro deixa claro que não está interessado na narrativa de democracia na qual Lula está empenhado. Sob seu governo, a Venezuela tornou-se ditadura escancarada, enveredou para o fascismo e flerta com o totalitarismo. E ele está se lixando para a aparência de legitimidade que Lula quer ajudá-lo a produzir.
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